sexta-feira, 13 de maio de 2011

Ditaduras militares na América Latina - ascensão e queda

Quando observamos a História política na América Latina, é praticamente inevitável desfazer-se da idéia de que a influência exercida pelos Estados Unidos da América na conformação de tendências e políticas governamentais foi imenso, políticas estas amplamente influenciadas pelo jogo de interesses, sejam eles interesses burgueses ou dos operários. Em meados do século XX, as repúblicas latino-americanas, no geral, passam por um processo de crise - que é fundamental pra compreender as décadas seguintes.

Vale ressaltar que a década de 1950 é um importante marco para o início desta crise - A revolução cubana em 1959 teve, para o nosso continente, o impacto metafórico de um "sopro de ar fresco". Foi a primeira revolução na América Latina a ter ido até o final e triunfado, promovendo uma grande insurreição camponesa e a uma greve geral.


Entre 1959 e 1961, Cuba viveu um período de muita turbulência política, o que incluiu até mesmo a defesa de tentativas de invasão e contenção da revolução por meio de forças militares norte-americanas (Invasão da Baía dos Porcos). Um fator agravante é que a União Soviética, grande símbolo de revolução social e implantação do modelo socialista não havia visto a Revolução Cubana com grande simpatia. Em meados da década de 1920, os soviéticos já não queriam mais pensar em revoluções. As políticas pós-Lênin, ou seja, stalinistas visavam a manutenção do status-quo soviético onde a "explosão" da Revolução é contida e administrada burocraticamente, numa perspectiva até mesmo conservadora.

Até que Cuba conseguisse estabelecer a solidez de sua revolução, a URSS mantinha-se como espectadora distante. Obviamente, após todos os sinais de que a Revolução enfim triunfaria, o próprio governo revolucionário cubano almejou uma aliança com a URSS, respeitando a política burocrática vigente. Este fato inclusive é considerado decisivo para o rompimento das relações de Fidel Castro com Ernesto Che Guevara – mais idealista e crente de que a revolução tinha um caráter universal, incentivando a instalação de grupos guerrilheiros em vários países da América Latina e Terceiro Mundo, chegando até mesmo a participar da luta armada em países como o Congo na África e nos planaltos da Bolívia - onde foi capturado e morto pelo exército boliviano amplamente apoiado pela CIA. Os Estados Unidos estavam convencidos de que o grande "cérebro" da Revolução cubana havia sido eliminado da cena, sem, contudo atentar-se para o fato de que o “espírito” contestatório já germinava em toda a América Latina.

A partir daí, toda a onda de influência direta e indireta da política norte-americana na instalação de governos contra-revolucionários visavam assegurar com tudo o fosse necessário, que jamais veríamos algo semelhante ao ocorrido em Cuba novamente.

O Golpe Militar de 1964 no Brasil e a Operação Brother Sam

O primeiro grande golpe militar na América Latina surge no Brasil, país de extensão continental que fazia fronteira com quase todos os países da América do Sul. Desde 1960, com a eleição da chapa Jan-Jan (Jânios Quadros e João Goulart, o “Jango”) o programa de governo de Jânio Quadros (que possuía no currículo uma ascensão meteórica ao poder que em 15 anos passou de professor de Geografia e Direito Processual Penal em São Paulo para Presidente da República, passando pelos cargos em São Paulo de vereador, deputado estadual, prefeito, governador e, por fim, presidente do Brasil com uma margem de vantagem que atingia os dois milhões de votos sobre o marechal Henrique Lott) não possuía vínculos com “clãs”, não tinha padrinhos, não era dono de jornal ou nenhum outro veículo de comunicação, não era rico, não possuía ligações com nenhum grupo econômico, não tinha vínculo com EUA e nem com a Rússia e por fim, condenava o comunismo. Jânio e seu programa de governo estavam completamente alheios a qualquer grupo de influência nacional e internacional na época e sua ascensão ao poder fortemente ligada ao seu incrível carisma e apelo popular representando genuinamente um político que buscava a estabilidade, rompendo com fórmulas antiquadas e uma abertura para novos horizontes. Combatendo à burocracia estatal brasileira, adotou uma prática que remete à Winston Churchill, o de comunicar-se com ministros sem intermediários direcionando memorandos – que foram apelidados jocosamente de “bilhetinhos do Jânio”. Uma série de ocorrências insólitas marcaria negativamente o governo de Jânio diante das alas mais conservadoras.

Uma condecoração ao líder guerrilheiro Ernesto Che Guevara em 19 de agosto de 1961 com a Grã Cruz da ordem Nacional do Cruzeiro do Sul num ato de agradecimento pelo mesmo ter ordenado a libertação de sacerdotes cristãos de Cuba que estavam condenados ao fuzilamento, após um pedido de Jânio Quadros que representava na verdade as pressões vindas do Núncio apostólico brasileiro que o solicitou em nome do Vaticano – este entre outros atos que incomodavam o empresariado mancharam de vez sua reputação frente aos conservadores anticomunistas, levantando a hipótese de que Jânio simpatizava-se com o guerrilheiro argentino e o discurso de esquerda. Alegando “forças terríveis” que se levantavam contra si, Jânio renuncia do governo em 25 de agosto de 1961 tendo cumprido apenas sete meses de mandato.

Nesta mesma época, seu vice, João “Jango” Goulart, realizava uma missão diplomática na República Popular da China e mesmo com tentativas de impedir a sua posse como presidente em seu retorno, Leonel Brizola então governador do Rio Grande do Sul mobilizou o estado em defesa da posse de Jango, naquilo que ficou conhecido como “campanha da legalidade”. Na volta da China, Jango desviou o vôo para Montevidéu no Uruguai e aguardou o desfecho do impasse. Finalmente, em oito de setembro do mesmo ano, assume a presidência do Brasil.

Em 1962, o governo Goulart aprova o Plano Trienal elaborado pelo economista Celso Furtado – que dentre muitas características não possuía simpatia da alta burguesia brasileira. O plano falhou devida grande adesão das oposições ao boicote. A economia então mergulhava em um período de inflação e crises econômicas. Desgastado com o conflito de posições político-econômicas, em meio a acusações de que o Jango era um “subversivo”, em 1º de abril de 1964 o governo sofre o famigerado Golpe Militar, denominado de “revolução” por seus executores.

O golpe militar brasileiro não apenas contou com o patrocínio político-ideológico americano como também o apoio militar. À época do golpe, a CIA havia acreditado na possibilidade do golpe desencadear uma guerra civil e mobilizou toda a frota do Caribe para a costa brasileira munida de 100 toneladas de armamentos, uma esquadrilha de caças aéreos, um navio de transporte de helicópteros, um porta-aviões do tipo Forrestal, seis destroyers, um encouraçado, um navio de transporte de tropas, 25 aviões C-135 para transporte de material bélico entre outros. A invasão americana já estava completamente organizada caso o golpe de 64 falhasse. Não foi o caso.


O Golpe Militar de 1971 na Bolívia


A Bolívia já vinha adotando políticas econômicas conservadoras já na década de 60, abrindo a sua riquíssima indústria de minérios ao investimento estrangeiro. Movimentos guerrilheiros que se organizavam nos Andes bolivianos tornaram-se alvo dos militares liderados pelo então presidente Renée Barrientos. É neste período que o núcleo rebelde liderado por Ernesto Che Guevara foi derrotado, com ajuda da CIA, Che Guevara havia sido assassinado. A morte de Barrientos num estranho acidente de Helicóptero em 1969 gerou um período de grande instabilidade com uma sucessão de governos de curta duração até 1971, quando o então general Juan José Torres fora derrotado por um golpe de Estado liderado por Hugo Bánzer Suarez. A partir de então, a Bolívia não mais abrigaria qualquer sombra de guerrilhas opositoras armadas tanto na região andina quanto nas terras baixas a leste, próximas à fronteira com o Brasil. Presente na Bolívia desde a caça de Ernesto Che Guevara, a CIA proveu todo o know-how tecnológico, militar e intelectual ao governo Bánzer Suarez.

O Golpe Militar de 1973 no Chile

Salvador Allende havia conquistado o poder no Chile pela via eleitoral com uma campanha que propunha transformar o Chile em um regime socialista – ainda que de forma pacífica e apaziguadora, concedendo liberdade de imprensa e respeitando a constituição. O movimento operário do Chile era considerado um dos mais expressivos da América Latina - o que fazia das frentes de direita do Chile e os Estados Unidos desconfiarem da política amigável de Allende. Houve até mesmo o interesse explícito, de acordo com a Associated Press, de o governo americano impedir a posse do recém-eleito Allende em 1970. Optando por maneiras sutis de sabotagem ao governo Allende, posteriores acusações dão conta de que o governo americano passou a financiar maneiras de espalhar a desordem no Chile. Uma destas maneiras foi o de financiar uma gigantesca greve de caminhoneiros que afetava diretamente o abastecimento e mercado alimentício do país. As várias empresas transnacionais do Chile passaram a aderir à política golpista adotando uma série de medidas cuja finalidade era a de criar um ambiente instável cuja única forma de haver estabilidade política e econômica seria por meio de ação da força. Estava sendo criada uma gigantesca crise econômica artificial para mostrar não só que o governo Allende era um fracasso como também era preciso dos militares no poder.


É neste clima que em 1973 os militares chilenos decidiram aplicar o golpe de Estado, liderados pelo general Augusto Pinochet. À exemplo do que ocorrera no Brasil com a Operação Brother Sam, os EUA havia mobilizado navios e aviões para o Pacífico sul – a princípio alegando estar apenas participando de um exercício naval de rotina junto às marinhas latino-americanas e posteriormente alegando a observância da complicada situação no Chile, afirmando poder invadir o Chile sob o pretexto de, em decorrência da situação de instabilidade política do país sul-americano, zelar pelas vidas de cidadãos americanos residentes no país. Eram apenas máscaras que escondiam a retaguarda americana de prontidão caso houvesse resistência ao golpe militar de Pinochet. Há quem afirme que o verdadeiro início do Neoliberalismo se dá no Chile com Pinochet, que promoveu uma monstruosa onda de privatizações no país, tendo privatizado inclusive a educação chilena.


O Golpe de 1976 na Argentina


O golpe de 24 de março de 1976 era parte do chamado “processo de reorganização nacional” frente ao neoperonismo. A Argentina passava por um período de abalos econômicos, conflitos sindicais e constantes embates entre guerrilheiros de esquerda (ERP/Montoneros/PRT) – uma verdadeira frente esquerda armada contra milícias de ultradireita (Triple A) cuja principal atividade era a caça de subversivos. O golpe argentino havia sido fortemente influenciado pelo golpe chileno. A ditadura argentina, embora de pouca duração (1976-1983) é considerada a mais brutal da América Latina, com envolvimento em milhares de seqüestros, torturas e até mesmo campos de concentração. Foi a mais mortífera ditadura da América do Sul.

O golpe havia sido amplamente apoiado pelo governo norte-americano que possuía agora o apoio da Argentina junto aos outros países do cone sul para o que ficou conhecida de Operação Condor, uma liga de governos militares da América do Sul em ações que objetivavam a extinção total e completa de toda e qualquer organização opositora das ditaduras militares sul-americanas e grupos guerrilheiros de esquerda. O golpe argentino ainda contou com aviso prévio para os governos chileno e brasileiro, com telegramas enviados com meses de antecedência que além de avisarem sobre o golpe, mencionavam a adoção de novos planos econômicos assinados pelo então ministro da economia argentino José Alfredo Martínez denominado de “política de Neoliberalismo”, demonstrando clara inspiração chilena do modo como a Argentina conduziria o seu rumo econômico da segunda metade da década de 70 em diante.

A Argentina também receberia da FIFA, presidida pelo brasileiro João Havelange, a sede da Copa do Mundo de 1978 que foi usada pelo governo militar argentino como propaganda interna e externa de sua ditadura, utilizando do esporte mais popular do país, o futebol, como a grande ferramenta de manipulação da população, objetivando a criação de um espírito nacionalista contra a “ameaça comunista”. A Argentina foi campeã da competição de forma duvidosa, com acusações de manobras de bastidores que conduziram o time argentino ao título.

O declínio das ditaduras – o conceito de “redemocratização” na América Latina

Conforme vimos, as ditaduras militares ocorridas em toda a América Latina, em especial nos países mencionados, foi um processo orquestrado que tinha o objetivo de demonizar os eventos de 1959 em Cuba e impedir que o “sopro de ar fresco” gerado pela revolução cubana influenciasse os países latinos. A revolução cubana “ascendeu o botão de alerta” no poder político-econômico americano, de modo que os EUA passou a ver o problema da oposição política e econômica ao modelo capitalista não mais como um fenômeno do leste europeu, mas uma ameaça tão próxima ao ponto de estar em seu “quintal”. Foi aplicada uma série de medidas ousadas na política externa americana envolvendo todos os seus braços de influência para impedir que o resto da América Latina se tornasse parte do bloco comunista. Da perspectiva marxista, os EUA passaram grande parte da segunda metade do século XX orquestrando um movimento contra-revolucionário no seu próprio quintal num jogo de xadrez simultâneo às preocupações com a corrida espacial, armamentista e ideológica travada entre os EUA e URSS.

Entretanto, quando se percebe que a ditadura não funciona mais, não dá mais “liga”, emerge o conceito de redemocratização na América latina apoiado pela mesma burguesia que outrora apoiou a repressão. Percebe-se, portanto a necessidade de criar um afrouxamento artificial nestas ditaduras antes que elas causem uma nova revolução, desta vez mais inflamada e geograficamente integrada contra um inimigo em comum, a direita e o poder norte-americano. Este é um conceito que tomará toda a década de 1980 no Brasil e em toda a América Latina. A primeira ditadura a ruir é a mais violenta delas, a Argentina redemocratiza-se em 1983 em plena ressaca causada pela recém perda na Guerra das Malvinas.

Em 1985 caem as ditaduras no Brasil e Bolívia. O Chile redemocratiza-se apenas em 1990. Vemos, portanto um novo afrouxamento das tensões políticas que dão lugar agora a uma nova forma de controle, o Neoliberalismo, inaugurado na América Latina em 1973 com Augusto Pinochet. No hemisfério norte três figuras proeminentes se destacam na moldagem de um novo mundo: Ronald Reagan nos EUA, Margareth Thatcher na Inglaterra e o João Paulo II que na liderança da Igreja Católica passa a exercer influência decisiva no Leste europeu, preparando e antecipando o novo mundo que surgia com a queda da Cortina de Ferro. Os dois primeiros promovem a “ditadura absoluta do mercado” em extensão local e global enquanto João Paulo II reintegra o fator religioso ao novo panorama internacional. O mundo passou de uma guerra ideológica para redenção total à mão invisível do capital não antes de estar munido de uma “Bíblia na mão” - era talvez a mensagem definitiva de “segura na mão de Deus e vai”. O Estado passa então por uma crise identitária. Torna-se célebre logo após a Queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, o Best-seller “O Fim da História e o Último Homem” (The End of History and the Last Man) de Francis Fukuyama, onde a História enquanto um embate de ideologias havia enfim atingido o seu hipotético fim.

Na América Latina, com o fim das ditaduras, emerge uma série de governos neoliberais. Na Argentina redemocratizada, vemos o surgimento do governo neoliberal de Raúl Alfonsín (1983) e Carlos Menem (1989), no Brasil: José Sarney (1986), Fernando Collor (1990) e Fernando Henrique Cardoso (1994). No Chile Patricio Azócar (1990) e Eduardo Ruiz-Tagle (1994), na Bolívia Jorge Quiroga (2001) e Carlos Mesa (2003).

A História não acabou: a ressaca neoliberal reinventa a esquerda na América Latina

As sucessivas crises econômicas surgidas a partir da adoção da política neoliberal (privatizações de empresas estatais, corte de gastos públicos, desregulamentações de serviços, fim de benefícios trabalhistas entre outros) promoveriam transformações profundas em nosso continente. Os governos de direita vão sucessivamente perdendo força e popularidade e os governos de esquerda “explodem” em eleições de toda a América Latina.


Vemos líderes como Hugo Chávez Frías (1999) na Venezuela, Ricardo Lagos (2000) no Chile, Luis Inácio Lula da Silva (2003) e Dilma Rousseff (2010) no Brasil, Néstor Kirchner (2003) e Cristina Kirchner (2007) e o retorno do Neoperonismo na Argentina, Evo Morales (2006) e a emergência do movimento cocalero na Bolívia, Rafael Correa (2007) no Equador entre outros, num fenômeno chamado de “Guinada à esquerda” marcam a política sul-americana deste início de século XXI, demonstrando que o poder político vem alternando de acordo com as conjunturas econômicas, demonstrando novas maneiras de encarar a política na América Latina não mais como refém dos interesses econômicos internacionais como um sujeito atuante no intrincado jogo de poder político e financeiro no mundo contemporâneo.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Hassan bin Sabbah - O precursor de Bin Laden



É comum vermos nos meios de comunicação de massa referências ao saudita Osama Bin Laden (morto no último domingo pelas forças militares americanas) como o grande símbolo do terrorismo religioso transnacional. Uma ressonância particularmente curiosa é encontrada em narrativas históricas que dizem respeito a um "senhor do terror" que vivia recluso em montanhas com um grande séquito de fanáticos religiosos.

No século XI viveu nas montanhas do norte do Irã aquele considerado por muitos a grande inspiração da vida de Osama bin Laden, Hassan bin Sabbah Homairi (conhecido no "O Livro das Maravilhas" de Marco Polo como Aladino, o Velho da Montanha.

Sabbah nascera no seio de uma tradicional família iraniana de Qom, 156km à sudoeste de Teerã, o grande centro de propagação de uma vertente esotérica do próprio Islamismo, o chamado "Ismaelismo", crença que se afastava do Islã sunita e xiita, acrescentando na lista dos profetas sagrados de matriz abraâmica (Adão, Noé, Abrãao, Moisés, Jesus e Maomé) o profeta Ismael - citado não só no Alcorão como também no Gênesis bíblico, como sendo o primeiro filho de Abraão com sua segunda esposa, a serva egípcia Agar.

Tendo estudado em Cairo, Egito em 1079, adquirira conhecimentos aprofundados do Alcorão além de textos do Antigo e Novo Testamento bem como escritos Vedas hindus (textos estes espalhados pelo Egito e Oriente Médio após as invasões de Alexandre o Grande, no século IV a.C.). Hassan unificou todos estes conhecimentos e adaptou-os ao Zoroastrismo - crença religiosa enraizada nas populações dos planaltos da Pérsia desde o século VII a.C.

Ao regressar para o Irã, passou a propagar a integração de todas aquelas crenças numa única doutrina, inquietando as autoridades locais. Na época, o Irã passava por um período de dominação dos turcos seljúcidas, adeptos da ortodoxia islâmica sunita e que já perseguia a vertente islâmica xiita, preferência iraniana de longa data.

Expulso do território iraniano, inicia andanças por todo o Oriente Médio, adquirindo um séquito importante em faixas territoriais que iam da Síria à região montanhosa ao sul do Mar Cáspio. Fixa-se nas regiões da Cordilheira de Elbruz, escondido em um vasto território de planaltos de difícil acesso, com montanhas que ultrapassavam os 5.000 metros de altitude, como o mais alto daquela região, o pico Demavend com exatos 5.655m do nível do mar.

Em 1090, com apoio de seus seguidores, promove a conquista da fortaleza de Alamut que significa "Ninho da águia" em persa. Alamut é uma fortaleza inexpugnável localizada no pico de uma montanha de 2.100 metros de altura construída aproximadamente no ano de 602 da era cristã para servir de refúgio ao líder Wahsudan, da província iraniana do Dailam. Da fortaleza do Alamut, Hassan bin Sabbah orquestrou a organização de uma seita apelidada de "Assassinos". As origens da empregabilidade do termo "Assassinos" é ainda fonte de muitas especulações. O termo derivaria do árabe "Hashishin" (usuários da erva "hashish" ou "haxixe"). Contudo, outras investigações concluem que Hassan bin Sabbah denominava o seu próprio grupo de "Asasiyun" que desginaria à pessoas que mantinham-se fiéis ao "Àsas" (que significa "fundação" em persa, fundação neste caso, uma referência ao próprio início de sua seita religiosa). A crença de que os "Assassinos" eram usuários de haxixe contudo, ainda mantém-se bastante popular entre vários historiadores. O termo "assassino" não só na língua portuguesa em outras línguas, é derivada da seita de Hassan bin Sabbah.

Não tardou para que aquele novo culto islâmico atraísse cada vez mais seguidores que passaram a organizar-se em três níveis hierárquicos, os iassek, (a grande massa de fiéis), os mujib - fiéis mais dedicados ao culto e por fim os fedayin que se sacrificavam em nome da fé. Muitas das informações vindas do grupo, até mesmo pelas dificuldades de comunicação existentes uma vez que estavam baseados em uma região extremamente isolada, são em sua maior parte, oriundas de fontes orais. Abundavam, por exemplo, relatos referentes às táticas usadas para induzir novos fiéis como a prática de ritos que levavam indivíduos à experiências em que eram convencidas sobre as "vantagens" da morte. Tais ritos envolviam o uso de substâncias psicotrópicas ou experiências sexuais com mulheres virgens. As várias paisagens e jardins naturais dos vales que rodeavam a fortaleza de Alamut, eram utilizadas como exemplos de "realidades metafísicas" que seriam presenteadas aos seguidores que obedecessem as ordens do líder Hassan bin Sabbah. Muitos seguidores praticavam o suicídio caso o líder exigisse, como forma de provar obediência e fé, pois o paraíso era assegurado àquele que fosse fiel às causas da seita - o que poderia incluir ordens para que seus fiéis partissem em missões cujo objetivo era o de matar figuras proeminêntes do clero e realeza espalhados por todo o Oriente Médio.

Emires, governantes de cidades, comandantes e clérigos de toda a região passaram a se preocupar com sua segurança e a utilizar armaduras em metal no seu dia-a-dia temendo ser vítima de atentados realizados com adagas ou espadas. Os assassinos apunhalavam suas vítimas geralmente pelas costas. Uma tática de intimidação bastante comum entre os assassinos era o de deixar um bilhete fixado com uma adaga na parede dos cômodos das vítimas, avisando-lhes da iminência de um atentado à suas vidas e quando menos se esperava, retornavam e executavam a vítima. Desta forma, a seita de Hassan passou rapidamente a ser conhecida como uma organização perigosíssima que recrutava assassinos políticos que durante um período considerável de tempo espalhou o terror e desconfiança em um Oriente Médio que também já sofria de invasões cristãs vindas da Europa, os Cruzados.

O Velho da Montanha - Imortal?

Após a conquista da fortaleza de Alamut, muitos seguidores da seita e o próprio Hassan bin Sabbah não tinham o costume de deixar o local. Era o esconderijo perfeito e poucos realmente conheciam a sua verdadeira localização.

Sabe-se que Hassan conquistara o Alamut com 56 anos de idade e estima-se que tenha vivido até os 90 anos de idade. A lenda de sua imortalidade surge porque possivelmente seus sucessores mantinham os mesmos costumes e práticas atribuídas à Hassan e como a notícia de suas mortes e sucessões raramente saíam dos limites da fortaleza, acreditava-se que "O Velho da Montanha" fosse imortal pois gerações após gerações ainda se ouvia falar do líder que se refugiava nas montanhas ao norte do Irã, em um corte cronológico que foge dos parâmetros de longevidade humana como o período de 1090 à 1256.

O fim da seita e a tomada de Alamut

O fim da misteriosa e perigosa organização é datada do século XIII quando uma onda de guerreiros mongóis avançam sobre a Ásia Central, tomando como base a cidade de Tábriz na Armênia. O imperador mongol Hulagu Khan liderou campanhas militares na maior parte do Oriente Médio e Ásia Menor, levando consigo a tomada de várias cidades e territórios o que incluiu a Fortaleza de Alamut em 1256. Era o fim de um reino de horror - que veio a encontrar curiosas ressonâncias no século XX e XXI com a Al Qaeda de Osama bin Laden.


Referências:

Bin Sabbah, o Homem que Inspirou Bin Laden (Marie Helène Parinaud) http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/bin_sabbah_o_homem_que_inspirou_bin_laden.html

Marco Polo: O Livro das Maravilhas Tradução de Elói Braga Júnior. Porto Alegre: L&PM, 2006.